A fé cristã, desde seu surgimento, tem sido marcada por provações e testemunhos de coragem. Se, nos primeiros séculos, mártires entregaram a vida em arenas e prisões, hoje presenciamos uma nova fase de perseguição — mais complexa e multifacetada — que se manifesta tanto em violência direta quanto em pressões culturais e legais. Neste artigo, buscamos aprofundar a compreensão desse fenômeno global, oferecendo reflexões históricas, dados atuais e caminhos de resistência.
1. Um Legado de Sofrimento e Esperança
Desde os primeiros cristãos, há um fio condutor de martírio que conecta as catacumbas de Roma aos desertos da Eritreia. Como declara Tertuliano: “O sangue dos mártires é semente de novos cristãos.” Essa convicção fortaleceu igrejas primitivas em meio à perseguição oficial do Império Romano e ainda ecoa hoje, lembrando-nos de que o sacrifício pessoal está no cerne do discipulado cristão.
2. Cenário Atual: Estatísticas e Tendências
Segundo o relatório mais recente da Portas Abertas, mais de 360 milhões de cristãos em 70 países enfrentam alto grau de perseguição ou discriminação (Portas Abertas, 2024). Esse número corresponde a quase um em cada sete cristãos no mundo, espalhados principalmente por:
- Ásia: Coreia do Norte, Afeganistão, Paquistão e China, onde regimes autoritários criminalizam a fé e controlam atividades religiosas.
- África Subsaariana: Nigéria, Somália e República Democrática do Congo, palco de ataques de grupos extremistas que veem a fé cristã como obstáculo à sua expansão.
- Oriente Médio e Norte da África: Irã e Líbia, onde leis islâmicas rígidas punem o proselitismo e a conversão.
- Índia: aumento de violência e intimidação promovidos por agências de nacionalismo hindu, resultando em destruição de igrejas e prisão de líderes locais.
Esses dados revelam que a perseguição não é um fenômeno isolado, mas uma realidade global em constante evolução.
3. Formas de Perseguição
- Violência Física
- Torturas, sequestros e assassinatos — como no caso dos trabalhadores cristãos em partes da Nigéria, vítimas de massacres étnico-religiosos.
- Prisões arbitrárias, exemplificadas pela detenção de grupos de oração na China e no Paquistão.
- Instrumentalização Estatal
- Leis antiproselitismo que proíbem a conversão de muçulmanos e punem rituais de evangelização.
- Fechamento forçado de igrejas e apreensão de propriedades, em nome de “segurança nacional” ou “interesse público”.
- Pressão Cultural e Midiática
- Criminalização de expressões públicas de fé por meio de acusações de “discurso de ódio” em países europeus.
- Cancelamento de profissionais que manifestam convicções cristãs, gerando autocensura e medo de represálias.
4. Exemplos Concretos de Coragem
- Cristãos norte-coreanos que, capturados na China, são deportados para campos de trabalhos forçados. Mesmo diante de condições sub-humanas, mantêm entrevistas clandestinas gravadas, relatando orações e o apoio mútuo entre irmãos na fé.
- Igrejas clandestinas na Síria, que, após a destruição de seus templos, adaptaram-se a reuniões domiciliares, reforçando laços de comunidade e solidariedade.
- Pastores na Índia que, sob risco de prisão, realizam sessões de pregação ao ar livre, oferecendo assistência jurídica e educacional a famílias vulneráveis.
5. Como Podemos Responder?
- Oração e Intercessão
Cultivar uma vida de oração constante, lembrando-nos das cartas de Paulo: “Lembrai-vos dos presos, como se estivésseis presos com eles” (Hb 13,3). - Denúncia e Visibilidade
Denunciar casos de perseguição a organizações internacionais e órgãos de direitos humanos, garantindo que as vozes dos perseguidos cheguem aos fóruns globais. - Apoio Material e Pastoral
Enviar Bíblias, recursos para reconstrução de igrejas e suporte a crianças órfãs de cristãos mártires, colaborando com entidades como Portas Abertas e ADF International. - Formação e Sensibilização
Promover cursos, seminários e palestras em paróquias e universidades que abordem a teologia do martírio e o valor do testemunho cristão na sociedade contemporânea.
Conclusão
A luta dos cristãos perseguidos é um chamado ao compromisso e à solidariedade universal. Mais do que uma estatística, trata-se de vidas entregues por amor a Cristo e ao próximo. Que Nossa Senhora, Mãe da Igreja, interceda por cada um deles e nos impulsione a ser sal e luz em um mundo que, tantas vezes, quer apagar o nome de Jesus. Enfrentemos este desafio com fé viva, coragem invencível e a certeza de que, mesmo na dor, a Igreja avança e triunfa.
“Não fomos nós que escolhemos seguir a Cristo; Ele nos escolheu para que demos fruto e o nosso fruto permaneça” (Jo 15,16).